As duas primeiras medidas judiciais – uma ação civil pública (ACP) por ato de improbidade administrativa, e uma denúncia criminal – protocoladas pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO), por intermédio das Promotorias de Justiça de Cristalina, no âmbito da Operação Toma Lá Dá Cá, tiveram liminares deferidas pela Justiça.
Na ACP, foi determinado, pelo juiz Thiago Inácio de Oliveira, o afastamento do vereador Silvano da Silva Leite, conhecido por Silvano da Rádio, do mandato que exerce, e decretada a indisponibilidade de seus bens, no valor de R$ 49.156,24, bem como do ex-servidor comissionado Alessandro José Antônio Felisbino Rosa, em R$ 12.289,06. Na ação penal, a juíza Yanne Pereira e Silva também determinou o afastamento de Silvano da Rádio do cargo de vereador.
Na ACP, o promotor de Justiça Ramiro Carpenedo Martins Neto relata que, por intermédio de denúncias anônimas, o MP-GO teve conhecimento de suposto esquema de “rachadinha” na Câmara de Vereadores de Cristalina e na Secretaria Municipal de Esportes, motivo pelo qual instaurou inquérito civil público. Foi apurado que parte do salário de Alessandro era repassado ao vereador Silvano Leite em espécie ou com o pagamento de boletos de consórcio de veículo de propriedade do parlamentar.
Durante as investigações, foi realizada interceptação telefônica, que constatou que Silvano Leite tinha conhecimento de que estava sendo investigado e teria apagado mensagens de aplicativo, ocultando provas. Mostrou também que os dados fiscais do vereador apontam movimentação financeira incompatível com a de parlamentar, com vencimentos líquidos em torno de R$ 6,5 mil – as movimentações semestrais atingiam cifras próximas de R$ 300 mil, nos anos de 2017, 2018 e 2019.
O promotor de Justiça pediu o afastamento cautelar do vereador Silvano Leite até o encerramento da instrução processual e indisponibilidade de bens. No mérito, pediu a condenação de Alessandro Rosa e Silvano Leite, sujeitando os dois ao pagamento de multa e de indenização por danos morais coletivos.
Ao proferir a decisão, o juiz Thiago Inácio de Oliveira entendeu que estavam evidenciados os requisitos para a concessão da medida cautelar de afastamento do vereador do cargo, para garantir a instrução processual. Segundo o magistrado, há robustos indícios de ofensa aos princípios da moralidade e legalidade, além de ameaça concreta de prejuízo à instrução probatória. “A farta documentação trazida ao processo permite, em conjunto, inferir que necessário o afastamento do vereador, pois, em tese, na posse de seu gabinete, pode interferir na produção de provas documentais e orais”. Ele citou também que o vereador já havia iniciado a ocultação de provas, o que poderia voltar a ocorrer, caso permanecesse em suas atividades, com acesso normal ao ambiente de trabalho.
“Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos”, explicou o magistrado. Em relação a Alessandro Rosa, afirmou que, com base na prova documental constante do processo, especialmente nos decretos de nomeação e exoneração, ficou demonstrado seu vínculo com a Câmara Municipal de Cristalina. Sobre a indisponibilidade de bens, o juiz esclareceu que a medida deverá assegurar o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito. ”Verifica-se que Alessandro Rosa teria participado de rateio de seu salário com Silvano Leite”, reforçou.
Criminal
A denúncia criminal foi protocolada pela 1ª Promotoria de Justiça de Cristalina e diz respeito ao esquema existente entre Silvano Leite e o ex-servidor comissionado Alessandro Rosa. O MP-GO descobriu que, como contrapartida à manutenção de Alessandro Rosa no cargo comissionado de assessor de Comunicação Social, com remuneração que variava entre R$ 6.756,72 e R$ 7.144,93, Silvano Leite utilizava parte do salário do servidor para quitar os boletos de duas cartas de crédito, que foram utilizadas na aquisição de um veículo Hyundai Sonata.
Segundo o promotor de Justiça Fernando Martins Cesconetto, durante interrogatório, Alessandro Rosa apresentou duas versões sobre a prática da “rachadinha”. Na primeira vez, chegou a ser formalizado acordo de não persecução penal, mas, após confronto de novas provas, foi constatada a contradição nas declarações, levando ao cancelamento do acordo. No novo depoimento, ele afirmou que começou a passar valores para o vereador mediante pagamento de boletos de prestações do veículo e que esta era a forma de manter o emprego na Câmara.
Fernando Martins Cesconetto, na denúncia, afirma que Alessandro Rosa teve participação ativa no delito, ao viabilizar repasses de parcela da remuneração decorrente do cargo público por ele ocupado, para satisfação de interesse alheio. Além disso, sustenta a denúncia, Silvano Leite, utilizando-se do cargo público, idealizou a conduta delitiva e articulou a consumação dos delitos. “Houve a constatação de que, valendo-se do cargo de vereador, Silvano Leite utilizou dinheiro público na origem, qual seja, parte da remuneração de Alessandro Rosa, assessor de Comunicação Social da Câmara dos Vereadores – por ele indicado à nomeação após o pleito de 2016 – para mero atendimento de interesses pessoais consistente em quitar dívidas pessoais do vereador, notadamente, de financiamento veicular”, relata a peça acusatória.
O MP-GO denunciou Silvano Leite e Alessandro Rosa por peculato. Requereu que as multas recolhidas por força da condenação sejam destinadas ao Fundo Penitenciário do Estado de Goiás. Além disso, pediu a reparação dos danos causados, no valor mínimo de R$ 11.639,16. Foi concedida pela Justiça, a pedido do MP-GO, a revogação da prisão preventiva do vereador, uma vez que já foram colhidas as provas necessárias para o trâmite investigatório.
Mandados cumpridos
Durante a Operação Toma Lá Dá Cá, desencadeada no início de março, foram cumpridos nove mandados de busca e apreensão e três de prisão preventiva em desfavor de vereadores no exercício do cargo. A Polícia Militar e o Centro de Inteligência do MP-GO deram apoio. A investigação apurou a existência da prática popularmente conhecida por “rachadinha” por parte de servidores públicos, em benefício dos parlamentares. Durante o cumprimento dos mandados de busca nas residências e na Câmara dos Vereadores, foram apreendidos extratos bancários, contratos suspeitos, agendas, cópias de cheques, cartões bancários, aparelhos celulares, computadores, pendrives e um aparelho de rádio amador que estava sintonizado na frequência da Polícia Militar.
Participaram da operação 12 promotores de Justiça, sob a coordenação dos promotores de Justiça Ramiro Carpenedo Martins Netto e Fernando Martins Cesconetto, 7 oficiais de Promotoria e mais de 50 policiais militares das Rondas Táticas Móveis (Rotam), Batalhão de Choque, Grupo de Patrulhamento Tático (GPT) e 32ª Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM) de Cristalina. Foram notificados 36 servidores para prestarem depoimento.
(Texto: João Carlos de Faria/Foto: João Sérgio – Assessoria de Comunicação Social do MP-GO)